Outras teorias e explicações

Aqui estão englobadas várias teorias e considerações que não se encaixam em nenhuma das classificações anteriores. Nem por isso são mais ou menos válidas. Alguns exemplos são a Criatividade como Solução de Problemas, o Processo de Criação, a Criatividade como Inteligência Manipulativa e o Papel dos Hemisférios Cerebrais.

solucaodeproblemasCriatividade como Solução de Problemas

Talvez a palavra criatividade não ajude a exprimir bem o que ela seja. Dita assim, “criatividade” sugere o aparecimento de uma obra espontânea, como o nascimento gratuito de uma flor. Criatividade não é isso.
Criatividade é sinônimo de solução de problema. Ela só existe, só se exprime, face a um problema real, concreto e, em grande parte das vezes, imediato. A criatividade parte de um problema na maioria esmagadora das vezes. Ou então, em casos excepcionais, vai ao problema. O problema, contudo, é sempre, invariavelmente, componente ativo, verdadeira razão de ser de tudo o que se compreende sob o título “criatividade”.

O caso mais típico de invenção é o de Arquimedes, a quem Hierão, rei de Siracusa, deu a incumbência de comprovar a composição de ouro de uma coroa. O velho sábio pensou meses e meses em busca de um princípio que fosse a solução para esse desafio, e quando finalmente viu, durante o banho, a água da banheira transbordar com o volume do seu corpo, gritou o célebre “Heureca!”. Não foi tanto o fato da água transbordar que determinou a solução, mas sim o fato de estar ele, literalmente, imerso no problema. A muitos parece que Newton descobriu a Lei da Gravidade Universal após uma maçã cair-lhe na cabeça. O que aconteceu foi que Newton resolver atacar um problema que Kepler e Galileu não conseguiram resolver: é necessário uma força exterior para modificar o movimento retilíneo uniforme de um corpo. Qual é, portanto, a força que desvia os astros da linha reta no espaço e os leva a descrever curvas? A queda de uma maçã sobre a terra cristalizou, no espírito de Newton, as idéias sobre os problemas a resolver. Quando, mais tarde, uma senhora perguntou como ele chegara a tal notável descoberta, Newton respondeu: “pensando constantemente nela”, quer dizer, no problema que ela veio a solucionar.

Não é necessário sequer apelar a gênios como Newton para ilustrar como o problema é importante para a criatividade. Vejamos umas curiosas argolinhas de plástico flexíveis, soltas, cada uma de uma cor diferente, todas com um pequeno corte na sua espessura. Para que servirão? Para diferir uma chave da outra, num chaveiro. É claro! No entanto, convenhamos: colocar uma argolinha colorida na cabeça de uma chave para diferi-la de outra é de um primarismo indiscutível. Por que, então, isso nos maravilha, pelo menos momentaneamente? Porque todos sempre tivemos, consciente ou inconscientemente, o problema de distinguir chaves em um chaveiro, sem que nenhum de nós tenhamos eleito este problema como desafio pessoal e queimado pestanas para solucioná-lo. Ninguém transformou esta pequena inconveniência num verdadeiro problema. Este foi o grande mérito do inventor das tais argolinhas.

Os exemplos são infinitos. O que vale a pena ressaltar é que, caso comece a julgá- los a partir do problema referente, provavelmente você vai começar a sentir uma pontinha de despeito, tipo “isso eu também faria…”. Casa isso aconteça, parabéns, porque você está no caminho certo.

Como disse Alceu, no século VI a.C., “toda a arte é solução de problemas”. Vale acrescentar: também a criação.

1263550_cmykProcesso de Criação

Vários cientistas, pensadores e artistas já se perguntaram como, afinal, acontece a criação. Embora muitos autores elaborem o processo de criação em até sete etapas, praticamente todos concordam com quatro passos básicos.

Estes passos foram elaborados com a colaboração científica do físico alemão Hermann von Helmholtz e de Graham Wallas, da Universidade de Londres.

  1. Saturação ou Informação: O primeiro passo do processo criativo nada tem de mágico ou misterioso. Na verdade, trata-se de um trabalho árduo e quase estafante. Segundo o dicionário, “saturar” significa “fartas, encher inteiramente, impregnar (com alguma coisa) até o ponto de não poder mais ser absorvido”. Em outras palavras, a fase de saturação envolve uma pesquisa profunda e sistemática sobre o problema a ser resolvido. A abordagem utilizada por Thomas Edison para resolver um problema é um bom exemplo de saturação. Ele dizia: “sou mais uma esponja do que um inventor”. Quando queria descobrir alguma coisa, primeiro procurava saber como outros tentaram resolver o problema. Então recolhia informações sobre as milhares de experiências e estudos que outros realizaram sobre o assunto. Este era apenas o ponto de partida para o seu ataque. Lembre-se: 99% de transpiração e apenas 1% de inspiração. Ou, como dizia um outro gênio, uma obra-prima primeiro tem que ser obra, para depois ser obra-prima. O preço de uma idéia é o raciocínio intenso, consciente, concentrado. É preciso combinar, adaptar e remontar. Porém, ao mesmo tempo em que se está trabalhando conscientemente em um problema, também o inconsciente está sendo saturado de informações. E, uma vez tendo forçado seu consciente até o limite sem encontrar uma solução, confie no seu inconsciente e deixe-o assumir a tarefa.
  2. Incubação: O segundo passo do processo criativo é passivo. Ficar tranqüilo, relaxar, não pensar no problema. Deixe-o em banho-maria no inconsciente. De alguma maneira misteriosa e aparentemente mágica, o inconsciente trabalha enquanto você relaxa, convertendo as informações coletadas durante a saturação em novos conceitos, em busca da solução do problema. Helmhltz dizia que as melhores idéias lhe vinham “durante a subida de uma montanha num dia ensolarado”. Einstein tocava violino, assim como o detetive Sherlock Holmes quando precisava resolver algum mistério (Conan Doyle devia entender do assunto). Outros acreditam que a melhor maneira para deixar o subconsciente trabalhar é ouvindo música, dirigindo, lendo poesia, pescando, caminhando, indo ao teatro ou lendo histórias policiais. Umas das melhores opções de comandar o inconsciente para trabalhar é a hora de dormir. Repasse mentalmente seus problemas, um a um. Diga a si mesmo que terá as soluções pela manhã, fique na expectativa. Descobrir a melhor forma para relaxar e deixar o inconsciente trabalhar é fundamental para um bom processo de incubação. Você já pensou como costuma relaxar?
  3. Iluminação: este é realmente o momento em que acontece a idéia, o “heureca” de Arquimedes. É o clarão de inspiração criativa que vem do inconsciente durante um período de incubação. Para otimizar este momento, convém manter uma atitude positiva em relação às idéias. Tenha uma mente sempre aberta, não rejeite idéias cedo demais, não as discrimine com demasiado rigor – neste momento, nada pior do que fazer um julgamento crítico da idéia. Deixe um canal aberto para que as idéias possam fluir. Outras atitudes que podem estimular o momento da iluminação são visitas a lojas, galerias de arte, andar pelas ruas, observar a multidão. Emerson recomendava que todos deveriam passar uma hora por dia meditando. A meditação desenvolve profundos insights intuitivos sobre problemas e projetos. Quando as idéias começarem a surgir, registre-as o mais rápido possível, mesmo que pareçam banais, ridículas ou absurdas. Use lápis e papel, gravador, computador, vídeo ou o que for mais prático ou confortável. Muitas idéias se perdem porque as pessoas confiaram em sua memória. “A memória mais forte é mais fraca que a tinta mais clara”, diz um provérbio chinês. Tenha sempre um bloco de anotações à mão.
  4. Verificação: Este passo é a validação das idéias. Seu julgamento crítica, sua prova de viabilidade. As idéias que você teve resolvem, de fato, o problema? São práticas sob um ponto de vista de aplicação? São possíveis de serem implementadas? É perfeitamente natural que esta etapa venha ao final do processo, pois, caso se apresentasse antes, promoveria uma interrupção no fluxo do pensamento. Atitudes como “não é possível”, “não dá para ser feito”, “é caro”, “é por demais complexo” ou mesmo um simples “não vai dar certo” são fatais durante as fases anteriores, mas não agora. Ao fazer a revisão e avaliação das idéias, pode-se descobrir que um pensamento aparentemente absurdo pode conter uma sugestão para uma abordagem completamente nova a um problema importante. Uma idéia que a princípio pareceu forçada pode abrir caminho para o desenvolvimento de um novo produto. As idéias brutas podem ser “buriladas” e lapidadas. Algumas serão descartadas, é claro, mas provavelmente muitas serão consideradas geniais. Neste momento do processo, vale a participação de outras pessoas. Pergunte o que elas acham da sua idéia, como elas são visualizadas, se acham que são viáveis. “Deixe sua imaginação voar solta. Depois, coloque-a em execução aqui no chão”: este é o lema de uma grande empresa norte-americana para seus engenheiros.

tumblr_inline_n54x2cqeSI1qhmiahCriatividade como Inteligência Manipulativa

Erich Fromm, em seu livro “Psicanálise da Socidade Contemporânea” (Ed. Zahar), apresenta a análise que me pareceu mais convincente das que conheço. Os animais, evidentemente, possuem inteligência, muitos em alto grau, uma inteligência perfeitamente apta a comportamento criativo – mas uma inteligência invariavelmente manipulativa das circunstâncias. Uma inteligência que os livra de problemas concretos e imediatos, ou que lhes garante recompensas concretas e imediatas. Todo ato criativo do animal segue tal objetivo de manipulação do seu meio, com vista a lucro real.

Já os homens possuem essa inteligência manipulativa, muitos em alto grau, e, além disso – o que os torna humanos – também uma outra forma de faculdade mental que os animais não possuem: a racionalidade. Esta é uma inteligência não condicionada a ganhos materiais e imediatos, não ditada precipuamente por interesse material ou sensorial próprio – mas por gratificações muito mais complexas, psicológicas, espirituais.

A racionalidade é uma faculdade humana voltada não para a manipulação do mundo, mas para sua abrangência, sua compreensão (filosófica, artística ou científica). Por isso, suas soluções nesses campos compreendem, explicam e interpretam o mundo. E dignificam todos a quem é dado o privilégio de partilhar seus valores.

As soluções da inteligência manipulativa jamais, por definição própria, podem chegar aos estágios qualitativamente superiores, humanos, da Filosofia, Ciência e Arte – ficando, em seu nível mais alto, no campo da Técnica.

Essa dicotomia esclarece bem as “diferenças de inteligência” antes incompreensíveis:

1ª) A do brilhante self-made man, com tremenda visão de negócios, ultracriativo na hora de modificar processos de produção e de abreviar o caminho para a fortuna, mas que não entende um único capítulo de Montaigne, acha Marcel Proust o maior dos chatos e só avalia os quadros de Picasso pelo preço dos marchands. Inteligente ou estúpido este homem? Responda sem esnobismo: juntar o primeiro milhão de dólares é impossível a um indivíduo estúpido!

2ª) E como explicar agora a performance de um Mozart, que, de acordo com todos os testemunhos, não servia absolutamente para nada, exceto para a música? Como classificar Bruckner que, fora de seu gênio na hora de compor, era um débil mental completo? Como explicar um Karl Marx, cujas idéias até hoje condicionam a nossa época, por bem ou por mal, e contudo era praticamente incapaz de ganhar um tostão, vivendo a expensas de um amigo, e acabando a vida em total penúria? Inteligentes ou estúpidos estes homens? Sem tantos desses “falidos” e pobretões, a humanidade estaria paupérrima. Pior ainda, nem existiria como humanidade.

O importante é notar que a inteligência “animal”, manipulativa das circunstâncias ambientais, e exercida em troca de recompensa concreta e imediata, não exclui necessariamente a faceta humana e compreendedora, a racionalidade. Voltaire ganhou muito dinheiro especulando na Bolsa – e jamais deixou de ser Voltaire. Até mesmo esteticamente, prefiro saber de Picasso arquimilionário a ver van Gogh definhando na mais negra miséria. Principalmente, no estágio atual de riqueza do mundo.

hemisferios-2-2O Papel dos Hemisférios Cerebrais

Segundo Katz (1978), as pessoas altamente criativas, ao fazerem referência a seus atos, discriminam dois aspectos: em um deles, o problema que está sendo trabalhado é percebido, de repente, sob um novo ângulo, ocorrendo uma reestruturação de velhas idéias e alcançando-se uma nova síntese. O segundo aspecto diz respeito à elaboração, confirmação e comunicação da idéia original.

Estes dois aspectos implicam processo de pensamento bem diferentes e segundo alguns autores como Blakeslee (1980) e Torrance e Mourad (1981), ocorreriam em locais distintos do cérebro. O primeiro teria lugar no hemisfério cerebral direito, o qual seria mais eficiente no processo de perceber problemas familiares sob um novo ângulo e rearranjar as idéias; o segundo dependeria do processo cerebral esquerdo, o qual teria sua especialidade nos processos de pensamento utilizados para confirmar, elaborar e comunicar.

O que tem sido proposto é que cada hemisfério cerebral teria sua especialidade: o esquerdo seria mais eficiente nos processos de pensamento descritos como verbais, lógicos e analíticos, enquanto o hemisfério cerebral direito seria especializado em padrões de pensamento que enfatizam percepção, síntese e o rearranjo geral de idéias (Katz, 1978). A atividade do hemisfério cerebral direito seria especialmente relevante para a criatividade musical e artística, facilitanto o uso de metáforas, intuição e outros processos geralmente associados com a criatividade.

Em pesquisas constatou-se que os hemisférios cerebrais pensam de forma essencialmente diferente: o esquerdo tendia a pensar em palavras, e o direito em imagens sensoriais.

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